
Durante mais de duas décadas tenho investigado como
psiquiatra e pesquisador da psicologia,
a última fronteira
da ciência: o mundo onde se
constroem os pensamentos e são geradas a inteligência e a consciência. E,
apesar de ser considerado um autor de
sucesso e de ter meus livros publicados em dezenas de países,
não me sinto um profissional
realizado, pois tenho
enxergado um massacre emocional nas sociedades modernas
que me vem tirando o sono e perturbando
a minha tranqüilidade.
Por pesquisar a mente humana e tratá-la, tenho
denunciado esse massacre sutil e sórdido
em congressos nacionais e internacionais.
Agora chegou a vez de escrever sobre
ele. Preferi escrever em
forma de ficção em
vez de produzir
um texto de divulgação
científica, pois sinto
necessidade de recriar imagens inesquecíveis que
estão na minha mente. Imagens
de pessoas que dilaceraram seu prazer de viver e sua
liberdade.
Cada capítulo
é um grito que ecoa
da minha alma. Usei
dados reais na construção
deste romance. Através
de emoções intensas
e de aventuras excitantes, meu
objetivo é dissecar um câncer social que tem feito literalmente
centenas de milhões
de seres humanos
infelizes e frustrados - em
especial mulheres e adolescentes.
Vivemos aparentemente na
era do respeito
pelos direitos humanos, mas, por desconhecermos o
teatro da nossa
mente, não percebemos que jamais
esses direitos foram
tão violados nas sociedades democráticas. Estou falando de uma
terrível ditadura que oprime e
destrói a auto-estima
do ser humano:
a ditadura da
beleza.
Apesar de serem mais gentis,
altruístas, solidárias e tolerantes
do que os homens, as
mulheres têm sido o
alvo preferencial dessa dramática ditadura. Cerca de 600 milhões
de mulheres sentem-se escravas dessa
masmorra psíquica. É a maior
tirania de todos
os tempos e
uma das mais devastadoras da saúde psíquica.
O padrão inatingível
de beleza amplamente
difundido na TV,
nas revistas, no
cinema, nos desfiles,
nos comerciais, penetrou
no inconsciente coletivo das
pessoas e as a
prisionou no único
lugar em que não é admissível ser
prisioneiro: dentro de si mesmas.
Tenho bem nítida
na mente a
imagem de jovens
modelos que, apesar de supervalorizadas, odiavam seu corpo
e pensavam em desistir da vida.
Recordo-me
de pessoas brilhantes
e de grande
qualidade humana que não
queriam freqüentar lugares
públicos, pois se sentiam excluídas e rejeitadas por causa da
anatomia do seu corpo.
Recordo-me
dos portadores de
anorexia nervosa que
tratei. Embora magérrimos, reduzidos
a pele e
ossos, controlavam os alimentos
que ingeriam para
não "engordar". Como
não ficar perplexo ao descobrir que
há dezenas de
milhões de pessoas
nas sociedades abastadas que,
apesar de terem
uma mesa farta,
estão morrendo de fome, pois bloquearam
o apetite devido
à intensa rejeição por sua auto-imagem?
Essa ditadura assassina a auto-estima, asfixia o prazer
de viver, produz uma guerra com o espelho e
gera uma auto-rejeição profunda.
Inúmeras
jovens japonesas repudiam
seus traços orientais.
Muitas mulheres chinesas desejam
a silhueta das
mulheres ocidentais. Por sua
vez, mulheres ocidentais
querem ter a
beleza incomum e
o corpo magérrimo das adolescentes das passarelas,
que freqüentemente são
desnutridas e infelizes
com a própria
imagem. Mais de 98% das mulheres
não se vêem
belas. Isso não
é uma loucura?
Vivemos uma paranóia coletiva.
Os homens controlaram
e feriram as
mulheres em quase todas
as sociedades. Considerados
o sexo forte,
são, na verdade,
seres frágeis, pois só os frágeis controlam e agridem
os outros. Agora,
eles produziram uma sociedade
de consumo inumana, que
usa o corpo da
mulher, e não
sua inteligência, para
divulgar seus produtos
e serviços, gerando um consumismo erótico. Esse sistema
não tem por objetivo
produzir pessoas resolvidas,
saudáveis e felizes;
a ele interessam as
insatisfeitas consigo mesmas,
pois quanto mais ansiosas, mais consumistas se tornam.
Até crianças e
adolescentes são vítimas
dessa ditadura. Com vergonha
de sua imagem,
angustiados, consomem cada
vez mais produtos
em busca de fagulhas superficiais
de prazer. A
cada segundo destrói-se a
infância de uma
criança no mundo
e se assassina
os sonhos de um adolescente. Desejo
que muitos deles possam ler atentamente esta
obra para poderem
escapar da armadilha
em que, inconscientemente, correm
o risco de ficar aprisionados.
Qualquer imposição de um padrão de beleza estereotipado
para a licerçar a auto-estima
e o prazer
diante da auto-imagem produz um
desastre no inconsciente,
um grave adoecimento emocional. Auto- estima é
um estado de
espírito, um oásis
que deve ser procurado
no território da
emoção.
Cada mulher, homem, adolescente e
criança deveriam ter
um caso de
amor consigo mesmos, um
romance com a
própria vida , pois todos possuem
uma beleza física e psíquica particular e única.
Essa frase não
é um jargão
literário pré-fabricado, mas
uma necessidade psiquiátrica e
psicológica vital, pois sem auto-estima
os intelectuais se tornam
estéreis, as celebridades
perdem o brilho,
os anônimos ficam
invisíveis, os homens transformam-se em miseráveis, as mulheres
não têm saúde
psíquica, os jovens
esfacelam o encanto pela existência.
Em breve encerraremos
nossa vida no
pequeno "parênteses" do
tempo que nos
cabe. Que tipo
de marcas transformadoras vamos imprimir no
mundo em que vivemos? Precisamos
deixar ao menos
o vestígio de que não
fomos escravos do sistema
social, de que vivemos
uma existência digna
e saudável, lutando
contra uma sociedade
que se tornou uma fábrica de pessoas doentes e insatisfeitas.
É necessário fazer uma revolução inteligente e serena contra essa dramática
ditadura . Os homens, embora também
vítimas dela, são inseguros
para realizá-la. Essa
batalha depende sobretudo
das mulheres. Neste romance,
apoiadas por dois fascinantes pensadores, um psiquiatra
e um filósofo,
elas empreendem a
maior revolução da
História. Porém, pagam
um preço altíssimo,
pois têm de
enfrentar predadores implacáveis.